← Voltar Publicado em

5 perguntas +1: Conheça a Flerte Flamingo, banda baiana que faz um samba-rock único e que pulsa Salvador

POR ISMAEL ENCARNAÇÃO

A banda surge em dezembro de 2014, em Salvador, a partir do encontro do vocalista e estudante de BI em Artes Leonardo Viana com o guitarrista Fernando Tavares(Nandinho). Nandinho, apesar de ter sido um dos principais pilares da formação, só tocou na banda até 2017, após a primeira apresentação, quando teve que ir para Boston estudar música.

A Flerte Flamingo hoje é constituída por César Neto(baixo) que foi o terceiro integrante a entrar na banda, Igor Quadros(bateria), Rodrigo Santos(guitarra), acrescentando uma outra textura, Bernardo Passos(percussão). A banda possui personalidade e um som divertido, desdobrando-se no samba-rock com os elementos que a transformam na Flerte Flamingo. E nessa entrevista, Leonardo Viana nos conta mais sobre a banda.


Foto: Arquivo pessoal

“Flerte Flamingo”: qual a origem do nome?

Bom, vou ser sincero. A história do nome surgiu com um dos bateristas, que era um baterista que tocava comigo na banda cover do Arctic Monkeys. Ele tinha entrado para dar esse help numa época que estávamos há muito tempo procurando alguém para o posto e a banda autoral dele ainda estava cambaleante.

Aí quando nós começamos a tocar, isso em 2016, no tempo que Nandinho estava fazendo faculdade em São Paulo, antes que ele descobrisse que não precisaria continuar lá, porque tinha passado em Boston, porque quando descobriu, veio para Salvador, a gente continuou tocando, nós três: eu, César e André(baterista). E nisso, a banda precisaria fazer um show e desde o começo, desde 2014, nunca havíamos feito.

É até engraçado, porque foi André quem tinha conseguido o show para nós, isso em um bar bem tenebroso ali em Brotas, hoje já não está mais funcionando. Sabe o filme do Bob Esponja? Então, foi como a cena que a coroa some e ele chega naquele bar que é muito inóspito, foi aquilo ali, tá ligado? Se estourássemos uma bolha de sabão iriamos apanhar dos fortões do bar até desmaiar. Aí nós chegamos no ambiente: motoqueiros de jaqueta, sinuca, lenços nas cabeças, mulheres tatuadas com roupas sensuais, pensamos: “bicho, chegamos aqui para tocar samba”.

E daí que para sermos anunciados no flyer do show precisávamos de um nome. Passamos semanas pensando em um e não vinha nada, tínhamos até decidido um que na época achei ótimo e que deveria ser o definitivo, mas quando estávamos prestes a enviar esse nome, o baterista abriu a tela do trabalho dele nessa época e tinha uma foto de dois flamingos com os pescoços entrelaçados, ele tirou a foto e nos enviou dizendo em tom de brincadeira que esse deveria ser o nome da banda.

Só que nós gostamos, achei que era um nome bom, sonoro e decidimos ficar com ele. Lembro que haviam pessoas que não gostavam, achavam ruim de pronunciar, mas fazer o quê? Se não tem um melhor, vamos continuar com esse. Quando Nandinho voltou, já tínhamos o nome que permaneceu e ele achou fantástico, ainda mais porque em um ano e meio de banda ainda não tínhamos decidido.

E hoje em dia acho interessante que depois que a gente organizou nosso som, com uma cara, uma estética mais concisa em termos de regionalismo, ter uma proposta que na época não tínhamos, o nome passou a ter sentido. Porque quando alguém hoje ouve a nossa música e relaciona com o nosso nome, a pessoa diz “claro!”.

Quais suas grandes influências? Que referencias consideram fundamentais para a formação do que a Flerte Flamingo é hoje?

Veja bem, na composição e nos arranjos tem uma distinção de influências, porque quando nossas músicas são compostas, na forma mais crua, tem uma cara muito forte de samba e música brasileira quando é tocada só no violão. Já quando é levada para a banda, existe a guitarra, a bateria, então a roupagem fica mais próxima de rock, por isso aceitamos o rotulo de samba-rock sem que nossas composições sejam clássicas de samba-rock.

Na composição, a influencia caminha muito paro o lado de Jorge Benson, Arctic Monkeys, porque eu ouvi muito Arctic Monkeys na minha vida, Beatles que é uma das bandas que mais ouvi nos últimos anos e tem Erasmo Carlos, tem Dorival Caymmi, a família Caymmi no geral, Tom Jobin, João Gilberto na maneira de escolher os acordes e de bater no violão na hora de tocar, isso por causa do meu mestre Aderbal Duarte que é um estudiosíssimo de João Gilberto.

Essas são as influências que considero as maiores para a composição. Na hora de arranjar entram outras influências em cena, como Mac DeMarco, Papooz que é um duo francês recente, tem também a Summer Salt, uma banda do Texas que descobrimos quando já tocávamos e que tinha um som que se assemelhava tanto com o que a gente fazia no palco quanto com o que queríamos fazer e aí passamos a nos mirar neles, mesmo após já termos gravado muita coisa, foi uma grande influência principalmente no que diz respeito a guitarra.

Como é ser uma banda independente se lançando no mercado baiano/nacional?

Sobre experiência de se lançar independente, acho que talvez hoje tivéssemos um pouquinho menos de dificuldades, um público mais receptivo, não sei. Mas acredito que a grande benção tenha sido lançar nossos materiais pós-expansão do streaming, porque as bandas que tentavam colocar seus trabalhos na roda em 2011, 2012 até 2015 tinham muita dificuldade, pois os únicos lugares que tinham para colocar eram o YouTube, no máximo o SoundCloud que eram plataformas que as pessoas não visitavam tanto para ouvir musica quanto suas bibliotecas de iPods e celulares com o que já estava baixado, ou seja, para ouvir o que era independente, as pessoas precisariam fazer um esforço a mais que era acessar essas plataformas.

Até o fato de ouvir e não poder sair dali, como era o YouTube, que deixava a tela do celular presa naquilo, dificultava no desenvolvimento dos números do artista. Quando entra o streaming, tá tudo em um pacote só, hoje você pode colocar numa mesma playlist Ariana Grande, Tangolomangos, Flerte Flamingo, então as bandas independentes estão ocupando a mesma prateleira que outras bandas grandes, o que facilita entrar no cotidiano das pessoas e se afeiçoar, também ajuda no fato das pessoas até mais próximas não enxergarem como uma “banda de brother” por não ser algo tão legitimado, enxergar as bandas independentes como artistas.

E quando se é independente tem que ter todo o nohall de divulgação dentro da sua cabeça, tem que saber compor, tem que saber arranjar, gravar ou coletar dinheiro para gravar em estúdios grandes, tem que organizar uma boa ordem de faixas, fazer uma boa capa, distribuir isso para as lojas de distribuição, Deezer, Spotify, uma única pessoa cuidando de tudo isso. Isso nunca aconteceu na indústria da música, o artista compunha, tocava e gravava, tinha alguém responsável para arranjar e produzir a música, alguém para fazer o reportório da apresentação do artista, outra pessoa para fazer a capa e alguém responsável por divulgar.

E hoje, com o próprio artista fazendo tudo é obvio que a qualidade de algumas dessas coisas cairão, porque a paixão maior dele é fazer a música, o restante que fica em detrimento. Ainda assim, vemos pessoas que estão muito mais inteiradas em fazer cada uma dessas coisas, mas a nossa parada é a música e preferimos ter outra pessoa responsável por essas coisas. Na nossa banda, os mais enérgicos para fazer isso sou eu e César, mas ele estuda direito, tem cobranças dentro de casa pelo pai ser um grande advogado, então acaba ficando entre eu ele para fazer e mais para as gravações, que preferimos normalmente juntar uma grana e fazer em um estúdio profissional pela qualidade.

Agora, em termos de distribuição preferimos que seja um terceiro e na maioria das vezes somos abordados por alguém do meio, estamos entrando em uma situação de reconhecimento com uma produtora que ficará responsável pela distribuição e marketing.


Foto: Arquivo pessoal

Já notaram reconhecimento do público?

Em termos de reconhecimento em relação ao nosso trabalho, acontece e ficamos muito felizes, porque nos nossos shows as pessoas vão, cantam, sabem as letras das músicas, é uma experiência muito legal. Ainda mais porque a gente percebe que as pessoas ali estão propostas a participarem de uma experiência de diversão enérgica.

Temos músicas mais viajadas, psicodélicas e em alguns momentos suprimimos essas musicas para pôr mais dançantes, porque percebemos que é o que o público está pedindo. Estão ali dançando com seus amigos, gastando onda e depois acontece até de falarem conosco e agradecerem no final do show. Tenho até uma história engraçada: uma vez quando estava chegando para a aula, na UFBA, estava subindo a escada e no momento que passei, duas meninas pararam, se olharam e quando estava me afastando ouvi o sussurro “Flerte Flamingo”.

Eu achei engraçado, pois a garota não sabia o nome, nada, só lembrou do rosto que ela tinha visto e falou o nome da banda e isso é exatamente o que a gente quer, não queremos que nos individualizem, só desejamos que as pessoas lembrem e gostem do nosso som, tanto que se analisar nossas capas, nossos conteúdos têm pouco do nosso rosto. No carnaval mesmo, estava parado, passando mal e chegou uma menina aleatória e começou a cantar e dançar na minha frente. É muito gratificante.

Mas a melhor experiência que tivemos foi descobrir que falavam de nós no Twitter, tem uma ferramenta de busca para a banda e muita gente fala na rede social, através dele descobrimos uma garota de Manaus que veio passar férias aqui em Salvador e não conseguiu ir ao show, pessoas do Rio de Janeiro que gostaram da música, e tem as pessoas daqui da cidade, que é o principal, como uma vez que publicaram dizendo que estavam pegando uma disciplina com a “aquele menino” da Flerte Flamingo, já chegamos na aula alertas e sem saber quem é, mas já sabendo que não podemos fazer merda.

Fora isso, tem as pessoas que falam mal mesmo, que deprimem a banda. Os haters não só falam mal de nós, como conseguem ser cômicos, nos fazem rir, porque eles também são bem criativos, um mesmo se chamava @torresmo, outro hater tinha o nome de @colegioscaros. É bem legal quando abrimos o Twitter e vemos isso, porque se alguém se coloca para falar mal da banda, não é porque ela não só não gosta da gente, a pessoa não se incomoda com o nosso som, ela se incomoda porque deve ter alguém em volta dela que goste.

Como definiria a banda em ritmos, estilo e emoções?

Gostei do emoções, porque normalmente as pessoas pedem para a gente definir um ritmo e não sabemos. Por que não sabemos? Porque a banda nunca foi formada com um intuito especifico, nunca falamos que estávamos com um projeto especifico com um estilo de música, só nos juntamos para tocar, até mesmo porque na época só tocávamos músicas estrangeiras. E aí que quando eu comecei a estudar violão brasileiro, no mesmo ritmo passei a escutar mais música brasileira, porque os caras estavam me mostrando, a partir daí me senti mais confortável para compor músicas assim.

Digão quando entrou trouxe dois sambas que eram da banda dele, e o samba foi o ritmo que mais nos deixou mais soltos, não sentíamos que estávamos forçando nada. Porque se estivéssemos tocando rock, sentiríamos que estávamos forçando algo e imitando os estrangeiros, que a linguagem é conhecida por nós, mas não é o que o nosso ambiente respira e pulsa. Sentíamos que era isso que tinha mais verdade. Que qualquer música que fosse composta e tivesse acordes e melodias mais típicas ficaria melhor, daria um up.

Então começamos a tocar samba, nem todas nossas músicas hoje em dia são sambas, se fizer um apanhado geral, é uma banda de samba-rock, uma formação de rock cantando canções que cruelmente são sambas, mas tem muitos elementos de indie, bedroom pop que está surgindo por agora. Em sentimentos, nossas letras passam um pouco de insegurança amorosa ou sentimental, mas feitas com esmero, não é algo feito de qualquer jeito e só para vendagem.

Nos shows criamos uma atmosfera agradável, um clima leve, não é um sentimento de marra, raiva ou fossa, é alegria, as pessoas estão sempre com sorrisos nos rostos, sorrindo para seus amigos e todos são convidados a estar ali se divertindo, sem público especifico, é para todos. Também é percebida a vontade de tocar se sobrepondo a de fazer sucesso na medida do agradável e necessário. O nosso objetivo com a arte é esse, não limitar, fazer com que todos gostem e se sintam felizes.

+1: Falando de futuro, quais as perspectivas para a banda? Tem algum novo álbum ou spoiler do que podemos esperar?

As perspectivas estão em torno da gravação de um novo material que já está em processo. Nós começamos a produzir, estamos construindo na verdade, ainda não apertamos o rec. As músicas para o próximo trabalho são algumas que já tocamos em algumas apresentações, mas que serão reformuladas, a maneira de tocar irá mudar. E por estarmos em processo de mudança, precisamos nos ausentar dos palcos, porque quando tocamos uma música de uma maneira e ainda precisamos reformulá-la e gravar, nós ainda não temos uma produção final e também não tocaremos do modo antigo, então o que tocaríamos nos shows? Fica complicado.

E como somos uma banda independente, precisamos de dinheiro para gravar e a única maneira de ganharmos dinheiro é fazendo shows. Então decidimos que nossa ausência do palco será só até o final desse semestre, no início do próximo terá apresentação, tentaremos adiantar a nossa produção no mês de junho e em julho já faremos show, voltaremos a tocar no Commons Studio Bar, que é uma casa que tem uma cara mais profissional na cena independente e que mostra trabalhar. Interessante que foi quando o Commons nos convidou para tocar lá que sentimos que o nosso trabalho estava sendo enxergado de uma maneira um pouco mais séria justamente por sentir essa diferença na proposta da casa.

Mas como não temos como prever em quanto tempo gravaremos o disco, provavelmente iremos lançar uma coisa antes, gravar duas músicas e lançar, não sei se faremos isso até julho, mas com certeza antes de agosto lançaremos pelo menos uma que estará no próximo trabalho. Esse será um trabalho um pouco maiorzinho, mesmo tamanho ou mais ou menos do mesmo que o Postura e Água Fresca, já temos faixa e nome escolhidos, só não temos a capa.

Esperamos não só atender ao público que acompanha o nosso show, porque tem músicas lá que já tocamos há algum tempo e ainda não foram gravadas, como também cooptar mais público e atender aos que só nos ouvem na internet, pois tem pessoas que nos ouvem frequentemente na internet e nunca foram nos nossos shows.

Temos aproximadamente 1.500 pessoas que nos ouvem no Spotify aqui em Salvador, em São Paulo temos um pouco mais que isso e são pessoas que serão impactadas por essas músicas na plataforma por nunca terem ido aos shows. Nos nossos shows vão 200 ou 300 pessoas, então há uma certa disparidade e esperamos que isso realmente coopte mais o público.



Foto: Arquivo pessoal